sexta-feira, 27 de julho de 2012

De extrativistas a gestores: castanha transforma a vida em comunidades da Amazônia


Pacto das Águas - Para alguns povos e comunidades da Amazônia o extrativismo não é mais uma alternativa de subsistência e sim uma atividade lucrativa que age também como uma estratégia política de gestão ambiental e territorial. Povos indígenas, extrativistas e agricultores familiares do noroeste de Mato Grosso e sudeste de Rondônia produzem cerca de 500 toneladas de castanha-do-Brasil por safra, comercializadas, em média, a três reais o quilo. Hoje em dia a qualidade do produto é tão boa que já há compradores interessados em comercializar as amêndoas na Europa.


“Depois de anos investindo em infraestrutura e boas práticas, os povos da floresta com quem trabalhamos atingiram um alto padrão de qualidade na castanha-do-Brasil e já são referência na Amazônia”, explica Plácido Costa, coordenador do projeto Pacto das Águas, patrocinado pela Petrobras, por meio do Programa Petrobras Ambiental e desenvolvido pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Aripuanã.

“Estamos consolidando uma rede de parceiros institucionais, governamentais e até empresariais de onde surgiu a demanda de novos mercados para a castanha”, complementa. O projeto realiza ações de suporte à organização social de comunidades para o manejo e a comercialização de produtos florestais. São parceiros locais os povos indígenas Zoró e Rikbaktsa, além dos seringueiros da Reserva Extrativista Guariba - Roosevelt.

Para Costa, o investimento em infraestrutura e boas práticas permitiu que os parceiros passassem a produzir uma castanha de melhor qualidade, agregando valor ao produto. Com a ajuda de assessorias técnicas, esses povos conseguiram acessar novos mercados, garantindo que um preço justo pudesse ser pago aos extrativistas. Para se ter uma ideia, há dez anos, o preço pago pelos atravessadores oscilava entre R$ 0,50 e R$ 1,00. “Hoje em dia, com uma castanha de boa qualidade, o mercado para comercializar o produto não é um problema e o preço pago fica em torno de R$ 3,00 o quilo”, garante.

Sócrates Zoró, que faz parte do conselho da Associação do Povo Indígena Zoró (APIZ) afirma que o extrativismo foi uma boa alternativa para a comunidade, que por alguns anos tiveram uma experiência negativa com madeireiras. “A castanha é boa para a comunidade e não atrapalha que nem a madeira”, afirma a liderança que envolveu toda a família no recolhimento e seleção dos ouriços. “A gente trabalha junto, mas cada um fica com sua parte da produção”, completa. 

Sócrates, em apenas um mês, já no final da safra deste ano, coletou 1.670 quilos de castanha que foram vendidos a R$ 2,50 o quilo. Sem abandonar suas roças, ele e muitos outros indígenas consorciam seus trabalhos agrícolas com a coleta da castanha no período das chuvas e a extração da seringa no período da seca. A seringa é uma segunda alternativa estimulada pelo Pacto das Águas que vem gerando bons rendimentos.

Esse apoio consolidado pelo Pacto das Águas vem despertando o interesse de outros povos indígenas, como os Arara, Gavião e Cinta-Larga. De acordo com Josias Gavião, seu povo, que divide a mesma terra indígena com o povo Arara, está em busca de alternativas eficientes de sustentabilidade, como a castanha e a seringa. 

“Conhecemos o projeto por meio dos índios Zoró, gostamos da proposta de trabalho e vimos uma potencial parceria”, explica. Para não dar um passo maior que a perna, Josias se reuniu com membros da aldeia e fez uma proposta: coletarem o que conseguissem de ouriços para avaliarem o interesse dos indígenas. Em menos de um mês e praticamente sem estrutura conseguiram coletar cerca de 20 toneladas de castanhas.

“Nós mostramos que podemos fazer o extrativismo, mas também temos ciência de que temos que ter os pés no chão e darmos um passo de cada vez”, completa Josias. “Com assistência técnica e um pouco de infraestrutura temos certeza que estaremos dando os passos corretos na sustentabilidade”, finaliza.

Extrativismo pode ser uma ferramenta de gestão ambiental e territorial
A agregação de novos parceiros ao projeto Pacto das Águas é vista com bons olhos pelos executores do projeto. De acordo com o biólogo Plácido Costa, alguns povos indígenas já demonstraram interesse nesse trabalho que além de ser uma alternativa de renda também pode ser uma ferramenta eficiente de gestão ambiental e territorial.

Com o extrativismo como fonte de renda os moradores das comunidades passam a percorrer mais seus territórios e essa ocupação inibe a entrada de terceiros nas terras para atividades ilegais. Além disso, com a floresta sendo produtiva há menos possibilidades de essas áreas serem abertas para outros fins. “A floresta, bem manejada, é uma fonte de renda e garantia de conservação ambiental”, complementa Costa.

Para garantir a inclusão dos novos grupos, foram realizadas em junho duas oficinas de planejamento. Uma em Juína, no noroeste mato-grossense, e outra em Ji-Paraná, no sudeste de Rondônia com representantes dos povos indígenas, de moradores da Reserva Extrativista Guariba-Roosevelt e de agricultores de duas cooperativas, a Cooperativa dos Agricultores do Vale do Amanhecer (Coopavam) e a Cooperativa de Produtores Rurais Organizados para Ajuda Mútua (Coocaram). Cada grupo definiu suas potencialidades e necessidades de capacitação e infraestrutura e os assessores do projeto Pacto das Águas estão estudando como atender essa nova demanda e buscando novas parcerias.

“O grande desafio ao trabalhar com essa diversidade de atores é considerar as diferenças culturais na estratégia de desenvolvimento do projeto”, explica Costa, exemplificando que agricultores e povos indígenas têm visões de mundo diferente e que mesmo entre um povo indígena e outro há aspectos culturais que precisam ser considerados.

“Nosso esforço agora é centrarmos em processos de formação e empoderamento das associações para gestão de negócios para que os povos indígenas, agricultores e comunidades tradicionais deixem de serem considerados como beneficiários e para serem realmente parceiros nas ações”, completa.


3 comentários:

Anônimo disse...

muitos dis defensor do povo da floresta mas ta por traz tirando aproveito eu conheço eu vivi isso abra o olho brasil

Deroní Mendes disse...

Obrigada, Anônimo pela visita e comentário aqui no blog. Eu também já vi casos assim, até porque sou filha de agricultores a a mais de 10 anos atuo profissionalmente nesse meio. Conheço o trabalho da Coocaram e do Sindicato dos trabalhadores Rurais de Aripuanã bem como dos profissionais envolvidos no projeto Pacto das Águas (http://pactodasaguas.org.br/), é um trabalho sério, feito com as a comunidades indígenas e rurais, onde eles são os protagonistas. Ou seja, é um trabalho de longo prazo, ou seja, as comunidades entendem o processo e a negociação com as empresas é feita diretamente com as instituições que os representam (associações e cooperativas). É um trabalho lindo de se viver.

volte sempre e comente também sempre que sentir vontade

André Alves disse...

Pois é, anônimo. Infelizmente há muito disso, de fato. Mas também existem muitos projetos sérios o projeto Pacto das Águas é um deles. O valor comercializado subiu em média 300% depois das capacitações de boas práticas e instalações fornecidas pelo projeto. E o dinheiro vai diretamente para os povos indígenas.