quarta-feira, 13 de julho de 2011

Marãiwatsédé: xavantes dão 20 dias para não índios que investiram todas suas economias saírem

Foto: Mércio Gomes
Deroní Mendes - Esta semana a TV Centro América afiliada da Rede Globo em Mato Grosso está exibindo no MTTV segunda edição uma série de reportagem sobre o conflito envolvendo  não indígenas e indígenas  da etnia xavante pela área localizada entre os municípios de alto Boa Vista e São Félix do Araguaia identificada, demarcada, homologada e registrada como terra Indígena Marãiwatsédé.

Ao todo serão 05 reportagens especiais. A primeira reportagem exibida  na segunda feira 11/07 pretendia mostrar  (...) porque os índios deram um prazo de um mês para retirar os não índios da área” já a segunda reportagem exibida ontem (12/07 terça –feira) “( ...) mostrou a realidade dos não índios que moram lá. São seis mil pessoas que investiram todas as economias na terra e agora podem perder tudo.

MTTV 2ª Edição - Cuiabá- Segunda-feira, 11/07/2011 - "Repórteres da TVCA mostram os conflitos entre índios xavantes e fazendeiros na disputa pela terra Marãiwatsede. Na primeira reportagem da série, veja porque os índios deram um prazo de um mês para retirar os não índios da área."


MTTV 2ª Edição - Cuiabá - Terça-feira, 12/07/2011 - "Na série sobre o conflito na reserva indígena Marãiwatsede, em Alto Boa Vista, o MTTV mostrou a realidade dos não índios que moram lá. São seis mil pessoas que investiram todas as economias na terra e agora podem perder tudo".


Achei que a reportagem foi feliz ao destacar que os indígenas  Xavantes foram retirados da área por volta de 1964 pelo governo federal através da Força Aérea Brasileira - FAB e a partir daí a Marãiwatsede  tornou-se um dos maiores latifúndio do país e passou sucessivamente  por vários donos até ser devolvida aos Xavantes em 1992 através de um acordo entre a empresa petrolífera italiana Agip então proprietária na época e o governo brasileiro. Também  foi feliz ao ressaltar que foi a partir daí que se iniciaram as invasões da área por fazendeiros, grileiros e posseiros.

Porém, apesar disso, achei a reportagem bem tendenciosa já pela chamada que anuncia as reportagens: “ porque os índios deram um prazo de um mês para retirar os não índios da área” e depois mostrar “a realidade dos não índios que moram lá. São seis mil pessoas que investiram todas as economias na terra e agora podem perder tudo.

 Achei que as chamadas induzem o telespectador  a considerar os xavantes como vândalos, barderneiros, agressivos e a considerar os não indígenas vítimas do governo federal e dos índio. 


Quer dizer que só porque os xavantes não investiram dinheiro em Marwãiwatsédé a permanência  deles em Marwãiwatsédé é menos importante e justa? Ou, porque os não indígenas estão em maior numero é injusto que eles tenham que sair da área que se instalaram ilegalmente e como bem frisou Dom Pedro Casaldáliga qualquer pessoa que comprou o título naquela área ágil de má fé, pois sabia  ou deveria saber que aquela área se tratava de uma terra indígena.

Na reportagem com os indígenas são entrevistados um agricultor “aterrorizado porque os índios incendiaram sua propriedade”;  Dom Pedro Casaldaliga e apenas 02 índios e apenas ao cacique Damião é feito uma única pergunta “O que representa essa foto?” Hã??

Já na reportagem sobre a “realidade dos não índios” são entrevistados um diretor de escola, 03 alunas uma delas muito emocionada e obviamente preocupada com a possibilidade da sua família ter que deixar o povoado e “não ter prá onde ir”chora. É de cortar o coração de qualquer ser humano. Também são entrevistados um comerciante, 03 agricultores e um senhor de nome Paulo de 68anos que investiu mais de 80 mil na área. Paulo se emociona e emociona o telespectador também, é claro.

Para todos os não indígenas foram feitas perguntas, para alguns mais que uma até. Eu sei e você sabe também  que quando se faz uma reportagem se coleta muita mais informação do a quantidade que vai ao ar, porque algumas “não ficam boas”, “o tempo da reportagem é curta”.   Mas ainda me pergunto: Porque na reportagem com os não indígenas não se entrevistou nenhum índio? Porque na reportagem sobre os indígenas são entrevistado apenas 04 pessoas  e já na outra foram entrevistadas 09 pessoas? Isso é ser imparcial? Por que não entrevistaram nenhuma criança xavante? Porque não tentar mostrar porque é tão importante para os Xavantes permanecer em Marãiwatsédé? Se apenas o cacique Damião concedeu  entrevista porque não o deixou falar mais? Porque não fizerem ou não mostraram as outras perguntas que lhe foram feitas?

Sobre a pergunta: "O que representa essa foto?" Ainda me pergunto: Foi mesmo a melhor que conseguiu fazer ou foi a única feita? Talvez uma pergunta como: o que representa (significa)  Marãiwatsédé para os xavantes o para o cacique Damião fosse tão ou mais relevante do que a foto em questão e a resposta do cacique Damião desse ao telespectador que não acompanha ou desconhece a questão indígena, a dimensão, o significado e o valor imensurável que tem o território para povos indígenas e tradicionais. Isso ajudaria diminuir a visão etnocêntrica que muitos têm sobre os povos indígenas.

É triste sim, para os não indígenas que investiram tanto lá ter que sair. Mas é ainda mais injusto para os xavantes pela segunda vez ter sair da terra que consideram sagrada onde viveram seus antepassados. Ë compreensível os os não índios estejam apreensivos preocupados, tristes e emocionados. Mas isso não os faz mais inocentes e com direitos de permanecer em Marãiwatsédé que aos xavantes. 

É sabido e a reportagem mostrou que as invasões e ocupação por não índio na área se deus  partir do momento em  que a empresa petrolífera italiana Agip devolver a área ao governo brasileiro para que os xavantes pudessem retornar para a área, ou seja, em 1992 quatro anos depois de ser promulgada a Constituição Federal cujo § 4º do artigo 231diz que ““São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
§ 4º - As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.” Constituição Federal de 1988, Art. 23, § 4º.

Partindo desse pressuposto, as pessoas que compraram os lotes lá deveriam saber que em se tratando de uma área reconhecida como área indígena não deveriam comprar porque o direito dos índios sobre ela é intransferível, inalienável e intransponível independente de quem ou das benfeitorias que não indígenas tenham construído no local.

Marãiwatsédé possui 152, 3 mil hectares, o governo do Estado de Mato Grosso através da Lei Estadual n.9. 564 de 27/06/2011 propõe que o xavantes de lá sejam removidos para o Parque Estadual do Araguaia uma área de 225 mil hectares. Já Plano de remoção dos não  índios da em elaboração pela Fundação Nacional do Índio - FUNAI, Instituto Nacional de Reforma Agrária – INCRA e Ministério Público Federal - MPF prevê que o INCRA deverá assentar todas as famílias que se enquadrar no perfil de cliente da reforma agrária em assentamentos. 

Então porque o governo do estado de Mato Grosso não pode conseguir uma área maior ou igual ao Parque estadual do Araguaia para os não índios que estão em Marãiwatsédé? 

A seguir cenas dos próximos capítulos que sinceramente espero que a justiça seja feita e que os Xavantes permaneçam em Marãiwatsédé.

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